O sol e os dois mares

Ficha 4×1

Data: 17/11/2012 à 20/11/2012

Trajeto: Seguimos sempre pela Carretera Federal 1 (México 1) sempre nos guiando pelas placas e orientações de locais. As estradas são, em grande parte, mão dupla, mas em muito bom estado.

Alguns buscam a “Baja” por suas ondas perfeitas no lado oeste (banhado pelo Pacífico) enquanto outros andam de caiaque, ou nadam tranquilamente, pelas inúmeras baías do seu lado leste (banhado pelo Mar de Cortez). Numerosos aposentados norte-americanos e canadenses fogem do rigoroso inverno, mais ao norte do continente, e dirigem seus gigantes RV’s (Recreational Vehicles ou como chamamos em português: Trailers) para acampar por até 6 meses em uma das belíssimas e sossegadas praias na parte central, ou mais ao norte da península. E a riqueza de sua fauna permite qualquer um nadar com lobos marinhos, tubarões-baleia e diversos peixes coloridos; ou simplesmente avistar golfinhos, raias, gigantescas baleias cinza ou apreciar os ágeis pelicanos dando grandes mergulhos em busca do jantar. Entretanto, apesar da fama que recebe por suas praias e sua vida noturna, a península mexicana da Baja Califórnia esconde, em seu interior, vestígios surpreendentes de vida pré-histórica que podem ser acessados por trilhas de alta ou baixa complexidade. Toda essa riqueza natural se estende pelos mais de 1.200km (norte/sul) dessa que é a segunda mais longa península do mundo! E apesar da curta faixa de terra (menos de 250 km) que une o Golfo da Califórnia (a leste) ao oceano Pacífico (a oeste), altos e coloridos canyons (com picos de até 3.100m) juntamente com gigantescos cactos, se espalham pelo terreno árido no meio da península. A Expedição fez questão de cruzar a península de ponta a ponta. E tudo começou pelo norte…

Os ágeis pelicanos que mergulham ao longo da Baja atrás de peixes.

Ahh!!! Como foi bom acordar novamente com a vista pra praia! A Tanajura já estava sentindo falta de experimentar o gostinho de sal novamente em suas ferragens  Essa era uma das facilidades e “luxos” que teríamos ali nos próximos dias pela Baja Califórnia. Nossa entrada na península se deu por Tijuana, a maior cidade do estado mexicano da Baja Califórnia (BC) e nossa primeira noite foi ali próximo, num RV Park, de frente pras “Playas de Rosarito”. Os RV Park (estacionamento de RVs – ou Trailers) são muito comuns ao longo da Baja por conta dos aposentados norte-americanos que passam meses por ali com suas “casas ambulantes” todos os invernos. Sendo assim, era fácil encontrarmos um lugar para encostar e Tana e montarmos nossas barracas.

Após meses sofrendo do frio norte-americano, levantamos bem cedo para aproveitar os primeiros raios de sol. Dedicamos as primeiras horas da manhã para curtir o momento ali em Playas de Rosarito. Ora um de nós sentava-se para ler de frente para o mar, ora arrumávamos algumas coisas dentro da bagunçada Tanajura. Aproveitamos também para dar uma caminhada pela praia até a vila de pescadores ali perto, para presenciar a venda matinal dos peixes recém-saídos das pequenas embarcações. Curioso foi ver, logo cedo, muitos locais já comendo peixe frito alie mesmo! Uma conversa com os curiosos vigilantes e um joguinho de basquete seguido de um “controle de bola”, nas quadras ali do RV Park, encerraram nossa manhã. Era hora de seguir mais ao sul.

Partimos em direção à Ensenada já no início da tarde. Mas antes paramos para almoçar em um restaurante simples, com cadeiras e pratos de plástico, ali no centro de Playas de Rosarito. É muito comum no norte da Baja restaurantes ao estilo dos tradicionais restaurantes do interior nordestino: muita simplicidade e gentileza, e a comida boa, farta e barata! E nós, é claro, comemos um dos pratos que mais gostamos até agora na Expedição: as quesadillas de Marlin. Mas também experimentamos outros dois muito tradicionais no México inteiro: os tacos de Pescado (peixe) e de Camarão! Mas não eram somente os restaurantes que nos remetiam ao nordeste brasileiro. Além das pequenas cidades litorâneas e das vilas de pescadores, o visual muda bruscamente ainda a poucos quilômetros da costa. As estradas que cortam boa parte da BC correm por dentro da península num terreno seco e pedregoso, onde enormes cactos se misturam junto a humildes casinhas de alvenaria. Uma realidade que presenciamos no sertão nordestino. A única diferença é que esse tipo de imagem seca e cactácea é majoritariamente vista em nosso país, há pelo menos 100, 150 km da costa, enquanto ali na BC são vistas a menos de 10km!

Ao cair da noite, o pneu murcho dessa passagem: empolgados por um malandro vendedor que disse que, “para termos uma verdadeira experiência da Baja”, não poderíamos deixar de ir à tradicional casa noturna Papas&Beers, compramos nossos ingressos antecipados (só para “garantir”). Acontece que, de fato, o Papas&Beers é um grande atrativo para jovens americanos e mexicanos ali na região. Mas mesmo sendo um sábado, estávamos na baixa estação e a belíssima estrutura do bar permaneceu quase que vazia a noite toda, sem nenhum dos principais atrativos funcionando. É… “rodamos”…

Na manhã seguinte seguimos para Ensenada. Uma volta pelo centrinho já nos revelava que aquela era uma cidade para turistas americanos: quase todos os preços nos catálogos eram em dólares, além de bugigangas e artesanatos que eram vendidos pelas ruas paralelas à da praia. O que salvava, no entanto, era a belíssima e gigantesca bandeira mexicana balançando na orla da praia e a interessante pracinha que, naquele domingo a tarde, contava com uma feirinha de culinária típica da região e apresentação de bandinhas locais. Na hora de dormir voltamos para o local onde horas antes havíamos presenciado um agradável pôr-do-sol: a praia de San Miguel.

San Miguel era o local onde costumava frequentar ninguém menos que Jim Morrison. Localizada a 11 km ao norte de Ensenada, a praia é um dos principais ‘points’ de surf em toda península da Baja Califórnia. Mais cedo havíamos assistido alguns surfistas pegarem as últimas ondas enquanto o sol se punha. E na manhã seguinte presenciamos muitos deles tomando seu café, e alongando, ainda antes das primeiras ondas da manhã. Acampamos ali mesmo no estacionamento da praia. Junto àqueles surfistas que em sua maioria provinham do estado norte-americano da Califórnia e haviam “esticado” até ali em busca das boas ondas e do calor mexicano. Pra dizer a verdade o calor não era tanto assim, pois como estávamos no inverno, os ventos do Pacífico logo cedo, e ao final da tarde, são bastante incômodos. Mas serenidade e o visual do local justificavam, e muito, as constantes visitas do astro do The Doors!

Vale mencionar que as estradas da Baja possuem fenômenos, vistas e algumas atrações à parte…

Ainda ali pela região de San Miguel, mais precisamente a 40 km ao sul de Ensenada, há um curioso efeito da natureza. A brusca movimentação da maré, contra um buraco encravado em uma parede rochosa, desencadeia uma longa e sequencial rebentação do mar jogando jatos de água a até 30m de altura! Esse espetáculo da natureza é conhecido como La Bufadora! Aproveitamos a vibe do local e ficamos ali por quase uma hora lendo, ou batendo papo. O sol e o clima ameno juntamente com as belas paisagens da Baja constantemente nos proporcionavam momentos de leitura, paz e reflexões.

Naquele início de Baja Califórnia nos movíamos lentamente. Pois, ainda por volta das 16h30 o sol já se deitava sobre o Pacífico e, para não pegarmos estrada à noite, dirigíamos muito pouco. Decidimos passar aquela noite não muito “longe” dali, em San Quintín.

O caminho desde San Miguel até San Quintín era de paisagens cambiantes. Oras cruzávamos o comércio pobre e rústico incrustado na vegetação árida de enormes cactos e pedras, ora avistávamos ao longe os verdes e vastos campos de videiras das vinícolas da Baja Califórnia. E ainda mais surpresas pela estrada estavam por vir!

Acontece que, apesar de termos chegado minutos antes do por do sol e não podido ver muito de San Quintín, ter dormido lá nos rendeu excelentes recomendações sobre a Baja. A simpática proprietária do Hotel e RV Park Cielito Lindo, juntamente com seu irmão, nos encheram de recomendações do que visitar! E na manhã seguinte, logo cedo, partimos.

Seguimos estritamente suas recomendações, conforme a seguir: siga ao sul de San Quintín até avistar os postes de iluminação que, entre os km 47 e 48, cruzam a pista e seguem pelo lado direito em direção ao oceano. Perfeito! Tomamos a estradinha de terra muito acidentada acompanhando os postes de iluminação. Sobe, desce, buracos, mais buracos, desce mais um pouco, a Tanajura trepidava que só, e de repente avistávamos um terreno plano com areia do mar e um imenso buraco, próximo a uma falésia. Dentro desse enorme buraco o mar entrava e, junto com ele, entravam também algumas famílias de lobos marinhos que desfrutavam daquela única prainha no meio da imensa falésia. A paz do local era tanta que ouvíamos nitidamente os “latidos” dos lobos marinhos que pareciam comentar uns com os outros sobre aqueles 5 intrusos que tiravam fotos deles.

Dali, cortávamos o interior da península a leste. Iríamos terminar aquela passagem pelo norte da Baja Califórnia com a nossa primeira visita ao Golfo da Califórnia (também conhecido como Mar de Cortez). Acostumados a ver os belíssimos pôr do sol do Pacífico, teríamos agora o privilégio de vê-lo nascer também no mar. Só que, dessa vez, no Mar de Cortez.

E se arriscássemos uma poética descrição do que presenciamos ali no Golfo da Califórnia diríamos que… o sol ascende do mar e logo colore o céu de vermelho e alaranjado. E em sua subida esconde-se lentamente por detrás dos morros de uma das várias penínsulas e ilhotas, que se encontram dispersas na serena imensidão da Bahía de Los Ángeles.

E esses foram somente nossos primeiros dias pela Baja!

 

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