Data: 11/07/2012 à 17/07/2012
Saimos de: Belém- PA
Destino: Manaus-AM
Tempo de viagem: 6 dias
Trajeto: Passamos pelo Rio Tapajós e pelo Rio Amazonas, sendo possível observar o encontro do Rio Negro com Rio Solimões.
Onde dormimos: Nas redes do ambiente com ar condicionado, que só fica ligado a noite.
O que comemos de diferente: Banana roxa, que compramos em uma das paradas do barco.
Pneu Cheio: Foram vários, mas o diferencial desse passeio é a interação com as pessoas. Uma situação específica que nos marcou foi ver alguns passageiros, de origem humilde, jogando sacolas com comida e roupas para os ribeirinhos que iam de canoa até as proximidades do barco.
Pneu Murcho: A falta de limpeza, juntamente com o baixo custo-benefício da comida, e o espaço limitado para a quantidade de redes que são colocadas.
Fazer a travessia de barco não foi uma decisão fácil. Primeiro porque teríamos que deixar a Tanajura por vários dias dentro de um barco que, a princípio, não seria o mesmo que nos levaria a Manaus. Em segundo lugar, porque teríamos que abrir mão de visitar Altamira, a cidade que serve de base para a construção de Belo Monte. Em contra partida, teríamos o benefício de não precisar dirigir na Transamazônica, que em muitos trecho não possui asfalto. Na verdade, mesmo se dirigíssemos na Transamazônica pelos mais de 1.400km, teríamos que embarcar o carro em Santarém para Manaus, pois a estrada acaba em Santarém, ainda no Pará. Nos encontrávamos numa encruzilhada. Se por um lado tínhamos o desejo de conhecer essas cidades e de “experimentar” os desafios da Transamazônica, por outro não nos sentíamos totalmente seguros em cruzá-la somente com as informações que tínhamos. Haveríamos, então, de ir atrás de maiores detalhes das condições da estrada nesse período e analisar os prós e contras de seguir de carro ou ir de navio pelos rios da região.
A busca por uma empresa que fazia o serviço de envio do carro e também oferecia o transporte de passageiros não foi fácil. Fomos de porta em porta em inúmeras empresas que fazem transporte de carga, mas nenhuma delas permitia que fôssemos juntos no barco. Depois de esgotadas quase todas possibilidades é que descobrimos no terminal de passageiros, que fica no portão 3 do Porto, que existe uma empresa que faz exatamente esse tipo de serviço. Como era um sábado a tarde, não tinha ninguém mais lá. Porém conseguimos um celular, que estava pintado no guichê. Ligamos e falamos com o Antonio Rocha, que nos disse para retornar a ligação na segunda-feira. Voltamos segunda-feira no guiche, mas para tratar da parte burocrática de envio do carro, a mulher nos mandou para o escritório da empresa, que ficava do outro lado da rua. Em paralelo, ligamos novamente para o Antonio Rocha, sem sucesso. Ao chegarmos lá, encontramos um terreno baldio, com duas pequenas construções que pareciam abandonadas. Fomos até a porta de uma delas e depois de muitas palmas e de muito chamar, a porta de madeira foi aberta, ficando apenas a grade entre nós e a secretária. Com pouca receptividade, depois de explicarmos o que queríamos, a grade foi aberta e fomos convidados a entrar. Como sempre fazemos, apresentamos o projeto, mas nos disseram que a única pessoas que poderia decidir sobre algum tipo de parceria era o Antonio Rocha e ele estava em viagem. Durante nossa permanência no escritório, observamos algumas fotos do Antonio Rocha na parede, e foi quando descobrimos que ele é deputado estadual pelo Pará. Ligamos para ele, e marcamos na terça-feira as 16:00hrs, porém de nada adiantou, pois ele não apareceu. Como estávamos, com o tempo corrido, afinal o barco sairia na quinta-feira, optamos na própria terça feira fechar o negócio como estava. De acordo com a secretária, os R$1.000 que estávamos pagando pelo envio da Tanajura, estava bem abaixo do valor praticado, que era de R$4.000, em função do tamanho do automóvel. Além do gasto com o envio da Tanajura, pagamos R$200,00 cada para dormir no andar com ar condicionado que só é ligado à noite. Ouvimos histórias de pessoas que tinham descontos especiais na passagem, por questões políticas, que preferimos não entrar em detalhes. Bom, sendo essas questões verdadeiras ou não, a decisão tinha sido tomada, o que de certa forma deu um alívio.
Quinta-feira, 12 de Julho, 6:00 da tarde – Chegamos no portão 3 do porto, local de embarque, 1 hora antes do horário previsto para o barco sair, 19:00hrs. O salão estava completamente lotado, um calor anormal, um cheiro horrível. Apesar da desorganização, conseguimos encontrar o fim de uma fila, na qual agurdamos por quase 2 horas até termos nossos bilhetes validados. Partimos para a próxima fila, a de embarque, que durou pouco mais de 30 minutos.
Bom, depois de entrar no catamarã e de pendurar as nossas redes de R$12,00 que compramos pouco antes de entrar no barco, vimos que não seria apenas uma experiência de dormir 6 dias em rede. A quantidade de pessoas que tinha no salão das redes era tanta que as redes em algumas situações ficavam uma em cima da outra. Não tocar uma rede na outra era praticamente impossível. Conseguimos dar um jeito de colocarmos nossas redes próximas uma da outra, e deixamos nossos itens de mais valor no escritório do gerente do navio.
Os dois primeiros dias foram entediantes. O almoço, que era servido em marmita e custava R$8,00, era servido às 11:00 da manhã e nos obrigava a ficar por algo em torno de 30 a 40 minutos na fila. O mesmo se repetia no jantar que era servido às 5:30 da tarde. Para nós, esse valor para uma refeição era aceitável, pois estávamos acostumados com São Paulo. Porém, para a maioria das pessoas que usavam o barco como meio de transporte, aquele valor cobrado, ainda mais considerando a qualidade da comida, era inadmissível.
O que alguns faziam era sair do barco quando atracávamos em alguma cidade ao redor do horário de almoço para comprar comida fora. Nós mesmos fizemos isso.
O banheiro, que era limpo uma vez por dia, era dividido por mais de 200 homens. Sem nenhuma atividade no barco, sem conhecer ninguém e com música extremamente alta na área mais arejada do barco, nos restou passar o tempo jogando cartas, principalmente UNO, também conhecido como mal-mal em alguns lugares. O estresse estava tão grande que acreditamos ter sido o período em que tivemos mais discussões entre nós mesmos. Mas, a partir do terceiro dia as coisas começaram a mudar. Fomos dando espaço para conhecer outras pessoas de diferentes localidades, idades, classes sociais, histórias de vida e com perspectivas de vidas diversas. Conhecemos uma versão feminina da nossa expedição, um pouco mais “roots”, desapegada, digamos. São 7 amigas, algumas uruguaias outras chilenas, que resolveram viajar pelo Brasil. Do pouco que conhecemos, vimos que elas tem uma liberdade maior, no sentido de que em alguns trechos, elas se separam 2 grupos, de acordo com o interesse de cada, e voltam a se encontrar depois de uns dias. Uma outra diferença é que elas não tem um carro, assim como a grande maioria dos viajantes que encontramos pelo caminho. Elas vão pedindo carona para chegar nos seus destinos. Mulheres corajosas!
Conhecemos também um rapaz que teve sua mala roubada 1 dia antes de embracar. Esse rapaz, chamado Rildo, embarcou em uma das várias paradas que fizemos, pois entre Belém e Manaus passamos por várias cidades (Breves, Prainha, Almerim, Santarém, Óbidos, Parintins, dentre outras) para carregar e descarregar diferentes tipos de produtos (vassouras, tomates, batatas, cebolas, frangos congelados, entre outros). Muito humilde e de bom coração, o Rildo, nos contou que sua mala com toda sua roupa, carteira, documentos, havia sido levada no salão de embarque. É claro que num primeiro momento existiu a desconfiança se aquele discurso era honesto ou se era mais um malandro querendo levar vantagem em cima dos outros. O fato é que ele nunca pediu nada, e com o passar dos dias, continuamos com a mesma boa impressão sobre ele. Chegamos até a oferecer um ticket de refeição em um dos dias, mas ele agradeceu e não quis aceitar. A única forma que achamos de ajudá-lo foi emprestando o celular pra que ele pudesse entrar em contato com a mãe e seu chefe.
Na parada de Santarém, muitas pessoas desceram, inclusive as uruguais. Estávamos aguardando ansiosos por essa parada, pois como ela é geralmente a mais demorada, tínhamos plano de visitar Alter do Chão, eleita com uma das praias mais bonitas do Brasil. Infelizmente atracamos em Santarém por volta das 17:00, e de acordo com o comandante a parada seria mais rápida que o tradicional, já que o barco estava atrasado. De qualquer forma, descemos para caminhar pela cidade, mas já estava tudo praticamente fechado. Quando voltamos para o barco, para nossa surpresa, haviam mais pessoas do que quando embarcamos em Belém. Tivemos que mudar nossas redes de lugar, pois algumas de nossas redes estavam em baixo de outras.
No dia seguinte, conhecemos Marjorie, uma carioca, de cidadania canadense com uma história de vida muito interessante, e de alguma forma, parecida com a nossa. Depois de morar por vários anos no Canadá, desde a época do colegial, ela resolveu largar toda sua estabilidade pessoal e profissional para iniciar mais um giro pelo mundo. Digo mais um porque ela já havia feito isso uma vez antes, o que fez com que chegasse a marca de mais de 80 países visitados ao longo de sua vida. Com uma capacidade incrível de elaborar um argumento longo para defender seus pontos de vista sem perder a linha de raciocínio e com muitas experiências de vida, a conversa com ela era bastante bastante prazerosa. Ela, que também possui um website contando suas experiências pelo mundo (http://marjorielopes.blogspot.com.br) nos acompanhou por 2 outros dias pela floresta amazônica, depois de chegarmos a Manaus. Junto com a Marjorie, também conhecemos o chileno Ariel e a francesa Mélanie, que estava rodando a América do Sul e a paulista Renata, que estava buscando emprego pela região norte.
Não foi simples chegar a essa conclusão, mas fazendo uma reflexão sobre esses 6 dias de barco, é possivel dizer que tivemos uma das experiências socio-culturais mais ricas da viagem. Uma das passagens marcantes, por exemplo, foi ver alguns dos viajantes, que em geral eram de classes menos favorecidas, jogando sacolas nos rios com roupa e alimentos para os ribeirinhos que vinham buscar os presentes de canoa.
Observamos também que ali era parte do trajeto dos garimpeiros que iam pra Roraima e para as guianas em busca de metais e pedras preciosas. Outro aprendizado interessante foi saber que em função do isolamento em que vivem os ribeirinhos, muito dos seus bens de consumo são conseguidos através de atravessadores que vão de barco até suas portas para trocar produtos como sabão, balde, fósforo por frutas e peixes pescados nas margens dos rios Tapajós, Negro e Solimões. Poder ver de perto o encontro dos Rios Negros e Solimões foi um dos pontos altos da viagem.
De certa forma, podemos até dizer que tomamos banho desses rios, afinal eram deles que vinha a água do chuveiro.
Não podemos deixar de falar que esse foi nosso primeiro contato com a floresta amazônica, que podia ser observada durante dia e noite de dentro do catamarã onde a mata toca o rio e todas as manhãs pássaros e botos dão um “bom dia” próximos ao navio.
Para ver mais fotos, clique aqui.
21 Comentários
Oi!! Sou brasileira, mas moro na Bélgica há quatro anos e agora estou voltando para o Brasil, com o meu namorado. Somos os dois cozinheiros e gostaríamos muito de conhecer a Amazônia e Belém.
Com esse barco que vocês pegaram é possível de conhecer as cidades, entrar em contato com a população local, e com os produtos típicos? Gostaríamos de conhecer, mas não de forma turística… Se tu puderes me dar o contato desse barco e algumas dicas, te agradeço muito! Vale mais a pena chegarmos em Belém, e pegarmos o avião de volta em Manaus? Muito obrigada! Carol (Não tenho facebbok, esse é da minha irmã!)
oi Carol
desculpa a demora em responder!
Então pegamos um barco das agências que vendem diretamente lá no porto de saída em Belém. Infelizmente não temos contato da agência pra te passar (a não ser o nome daquele deputado que está no post, ai talvez buscando na internet você ache algo) porque eles são realmente desorganizados. O serviço de venda e embarque prestado por eles é de péssima qualidade e desrespeitoso. Mas, infelizmente, foram as únicas opções que encontramos naquela época.
Quanto ao passeio em si, levamos quase 6 dias subindo o rio de Belém a Manaus. Esse barco é como se fosse um ônibus ou trem. Vai parando nas cidades que ficam na margem do rio. E ali sobem e descem passageiros, o barco fica parado de 30min a poucas horas em cada cidade dependendo de quanta carga sobe no navio.
É bom ter em mente que não é algo turístico em si. É um meio de transporte, então não há conforto nenhum. Banheiros são compartilhados, áreas comuns também, a limpeza é mínima e algumas condições para as pessoas não são dignas como deveriam ser.
Mas para gente foi muito interessante viver essa realidade e conhecer bem as pessoas que ali estavam ali. Se você tiver isso em mente e souber apreciar a beleza do caminho e o fato de conhecer pessoas muito bacanas, vale a pena!!
Para você conhecer bem as cidades no caminho talvez possa descer em algumas cidades e ficar uns dias em cada uma delas. Santarém, por exemplo, fica no caminho e é uma cidade grande comparada às outras. Mas para ver como funcionaria essas paradas, teria que conversar diretamente com a empresa que vende os serviços ou comprar a passagem por trechos. Sempre de ida.
Com relação a pegar o barco em Belém e comprar o avião de volta em Manaus acho realmente a melhor opção!! Ir e voltar esse trajeto de uma só vez seria cansativo demais! Acredite! hahaha
Esperamos ter ajudado.
Um abraço e boa sorte, pois realmente a culinária do Pará e norte do Brasil é MUITO diferenciada e especial!!!
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Meninos, adoro ler os relatos. A cada dia uma nova experiência… isso é impagável.
Boa viagem!!!
Oi Carmen, muito obrigado!! Realmente, as experiências tem sido impagáveis! =)
Nós que vivemos em ciadades metropolitanas não fazemos idéia das necessidades primárias que passam esses moradores dessa região. O que jogamos fora, para eles seria um luxo! Muito valioso esse aprendizado de vocês. Ele dá oportunidade para perceber o quanto temos a agradecer pela vida fácil que temos e ao mesmo tempo rezar e lutar para que todos os brasileiros tenham chancer iguais de sobrevivência!
Oi Rogério! Concordamos plenamente com você! Mais uma vez, muito obrigado por comentar e por nos acompanhar, grande abraço!
Angariando também o lado humano desta aventura, vemos o quanto estamos distante da justiça social ideal para nossos semelhantes.
A presença de vocês não é casual é a conspiração do bem para que sejamos mais gratos pelo que temos e somos.
Valeu rapaziada, e que a força esteja com vocês!!!!
Oi Luiz,
Pois é, a disparidade social do nosso país ainda é um problema muito latente, infelizmente!
E realmente, devemos sempre nos lembrar de agradecer pelo que temos e somos.
Grande abraço
Pessoal, já estava preocupada por vcs demorarem para postar notícias. Tb já estive nesse paraíso, o encontro das águas é muito legal. Desejo muito conhecer Ushuaia, onde vcs terminarão a viagem. Aguardo ansiosa e acompanhando-os. Boa sorte.
Oi Neide, é realmente um paraíso esse lugar! Ah, as vezes demoramos para colocar notíciais por causa da qualidade/disponibilidade da internet…. mas em breve vão entrar novos posts =) Obrigado por nos acompanhar! Abraços =)
SABE QUE JÁ TIVEMOS; MINHA IRMÃ E EU, ESSA EXPERIÊNCIA DE PREPARAR PRESENTES PARA OS RIBEIRINHOS……NO RIO AMAZONAS.
ESSE RELATO ME FEZ LEMBRAR DESSE EPISÓDIO HÁ MUITAS DÉCADAS ATRÁS…..
ESTOU AMANDO ESSA EXPEDIÇÃO DE VCS!!!
Oi Geyza!! Achamos muito interessante essa ideia de doações via barco, que legal que vocês já tiveram essa experiência!!
Queridos meninos, mais uma vez parabéns pelos relatos, fotos e vídeos. Imagino quanto conhecimento vocês estão adquirindo com esta expedição. É uma delícia poder lhes acompanhar através dos posts.
Deus os abençoe,
Beijos,
Miriam
Oi mãe! Agradecemos os elogios =)
Amém! Beijos!!
Galera!! Parabéns pela empreitada!! Sucesso para vocês e boa sorte.
Vou acompanhar a empreitada de vocês, estou planejando minha ida ao Alaska para 2014.
Abraços!!!
Oi Guilherme, muito obrigado! Está planejando ir para o Alaska em 2014 então? Sensacional! Estamos bastante ansiosos pra chegar lá!! Forte abraço!
Aí, eu quero um bom dia do botoo!!! Demais gente! A foto do pôr-do-sol com o menino é estúpida de linda hein! Parabéns!
hahahaha!! Valeu Má!! Gostei do elogio, estúpida de linda! hehehe
Beijão
Confesso que dei muita risada ao ler esse relato, pois vieram muitaaasss memórias de nossa passagem por lá! Sem dúvida, essa experiência de viajar de barco pelo Rio Amazonas é única! E bota única nisso! É mesmo coisa de outro mundo . . . um mundo que começamos a conhecer! Continuem aproveitando e conhecendo pessoas e suas histórias de vida! Boa viagem!
Valeu Grace! Essa parte de conhecer pessoas e histórias de vida sempre nos surpreende e nos agrada muito! Aliás, estamos precisando fazer isso aqui na Califórnia….por enquanto não tivemos essa oportunidade ainda! Abraços!